quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Cenas 30 e 31

Cena 30

WIDE: Fast motion, cama de Astrobaldo

Astrobaldo está deitado na cama. O tempo passa, anoitece e ele continua lá, vez ou outra se mexendo. Sei Não aparece de vez em quando, tenta fazer ele comer o jantar, mas Astrobaldo se recusa a cooperar. No meio da madrugada Jorge entra e dá uma olhada em Astrobaldo, depois forra o chão e sai.

Cena 31

Astrobaldo acorda, não está mais chorando. Olha para o local onde Jorge costuma dormir e vê alguém deitado, totalmente enrolado no lençol de forma que não dá para ver nenhuma parte do corpo. Vai para o banheiro. Para em frente ao armário, olha-se no espelho, depois abre a portinha, pega uma escova de dentes e fecha.

Astrobaldo escova os dentes e lava a boca. Vira-se e sai do banheiro.

Astrobaldo olha para a pessoa deitada no chão. É uma mulher, agora com a cabeça descoberta. Astrobaldo se assusta.

ASTROBALDO

(gritando e gesticulando)

Mas o que é isso!? Tão pensando que aqui é casa da Mãe Joana?

A mulher não reage aos gritos de Astrobaldo, continua dormindo.

ASTROBALDO

(grita e gesticula mas nunca toca na mulher)

Ei, você, acorde! vamos, anda logo, vamos, arrume outro lugar pra ficar porque aqui não é hotel não!

A mulher se vira, continua dormindo. Astrobaldo está impaciente, continua falando de longe e gesticulando, mas sem nunca toca-la.

ASTROBALDO

Ei,acorda, acorda, vamos, vamos...

A mulher continua sem reagir. Astrobaldo se retira, indignado.

SALA

Astrobaldo entra na sala. Sei Não está dormindo no sofá, jorge está encostado na parede com uma panela nas mãos, o conteúdo em chamas e ele cheirando a fumaça, comportamento claramente alterado, em estado de "lombra". Astrobaldo se aproxima de Jorge.

ASTROBALDO

(Mãos na cintura, tom moralista)

Mas o que é isso, Jorge!?

JORGE

(cheirando o vapor e com geito de maluco)

Meu irmão, eu já tô muito doido...

ASTROBALDO

(toma a panela das mãos de jorge)

Me dá isso aqui! Mas que diabos é isso????

JORGE

Pô, velho, se quer cheirar faça o seu.

ASTROBALDO

E eu lá tenho cara de usuário de drogas?

JORGE

Qualé mano, isso é pó de café com sabão, misturado com alcool para incendiar. Você cheira a fumaça e dá a maior viagem...

Astrobaldo abafa a panela e apaga o fogo.

ASTROBALDO

Já basta eu ter que agüentar vocês sóbrios. Quem é aquela mulher lá em cima?

JORGE

É a Cida, uma amiga que conheci esta semana.

ASTROBALDO

(visivelmente irritado)

E é assim, é!?? você conhece a mulher do nada e já chama pra morar na minha casa?

JORGE

Calma, Astro. ela é fundamental pra nossa banda.

ASTROBALDO

E quem disse que a banda precisa de uma mulher?

JORGE

É a nossa vocalista, pô.

ASTROBALDO

O que??? você tá ficando doido?

JORGE

Vai montar uma banda só de instrumental, Astro? Cola não, velho, o público gosta mesmo é de ouvir a voz de um cantor... e ter mulher no vocal tá na moda.

ASTROBALDO

Que vocal o quê, rapaz, deixa de conversa furada!

JORGE

Conversa o quê, Astro? O vocal é quem dá aquele clima, entendeu? Como se o som conversasse com o público através da poesia. A galera quer dialogar com a música, irmão, vai por mim. Tem que ter um vocal sim, se não agente não vai sair nunca do anonimato, veja bem o que eu tô te dizendo.

ASTROBALDO

O Lord da guitarra não tem vocalista e faz o maior sucesso! Vai la ver o show dele e pergunta se alguém sente falta de um vocal.

JORGE

E você quer se comparar com o cara é? agente tá só começando, ele já tem muitos anos de estrada.

Sei Não acorda, ainda preguiçoso e mole.

SEI NÃO

(ainda se espreguiçando)

Que é que tá pegando??

ASTROBALDO

Jorge arranjou uma mulher pra cantar na banda.

SEI NÃO

Maaaaassaaaaa!!!!

ASTROBALDO

Massa nada! agente não precisa de uma cantora.

SEI NÃO

Deixa pra ver, ué. Se não ficar legal depois agente dispensa.

ASTROBALDO

E ele ainda por cima trouxe a sujeita pra morar na minha casa!

SEI NÃO

Tem espaço. Agente arruma um lugarzinho pra ela aí e ela dorme.

ASTROBALDO

Mas só me faltava essa... Quando a Edjanete souber disso, vai querer me matar!

SEI NÃO

Ué, e você tem namorada? nunca falou dela pra gente...

ASTROBALDO

(constrangido)

Namorada não... é um... é um... um esquema.

SEI NÃO

Vocês estão ficando, então.

ASTROBALDO

Não é bem isso... agente... agente está se... entendendo.

SEI NÃO

Será que agente conhece a figura?

ASTROBALDO

O nome dela é Edjanete. Trabalha naquela loja de sapatos perto da feira.

JORGE

(dando gargalhada)

Cara, você está comendo a Edjanete???

ASTROBALDO

Tá com ciúme, é?

JORGE

(enfático e rindo)

Eu mesmo não!

ASTROBALDO

Ainda não tá rolando nada, mas agente está avançando. logo, logo agente vai se entender.

JORGE

Meu irmão, tu ainda está queixando ela, é??? Fala sério!!!!

Cida entrando, bocejando e se espreguiçando. Ela tem um geito tímido, olhar sempre disperso, usa uma saia colorida, com uma camisa simples. Jorge, Astrobaldo e Sei Não olham pra ela.

ASTROBALDO

Finalmente a bonitinha acordou...

SEI NÃO

Essa aí é a mulher??

Jorge se levanta, animado. Cida observa tudo, quieta.

JORGE

(Em tom formal, abre os braços e extende a mão para Cida)

Isso mesmo, meus amigos, eu vos apresento a nossa nova vocalista, Cidaaaaaaaa.

Cida vê o gesto de Jorge e retribui segurando a saia com as mãos (uma de cada lado), flexionando ligeiramente as pernas e inclinando um pouco o corpo para frente. Permanece onde está, observando todos.

ASTROBALDO

Muito bem, Cida. Então você é quem vai ser a vocalista da nossa banda, né...

JORGE

(interrompendo Astrobaldo)

Ei, agente nem deu um nome pra banda!

SEI NÃO

É mesmo, tem que ter um.

ASTROBALDO

E aí, vocês têm alguma idéia??

JORGE

Não me veio nada ainda...

SEI NÃO

Já sei! vamos chamar "BUUUU".

JORGE

Oooxee, que idéia é essa Sei Não? mas que nome doido...

SEI NÃO

Doido porque? é um nome totalmente Rock n' Roll, cara, simples, direto, sombrio...

JORGE

Nada a ver, nada a ver. Tem que ser algo mais racional, sei lá... Tem alguma idéia Astro???

ASTROBALDO

Eu mesmo não. Não sei, talvez alguma coisa tipo... A... Astro... Astro... sei lá...

JORGE

Ah, já sei! Que tal chamar "Grito Distorcido"???

SEI NÃO

É, acho que podia ser.

ASTROBALDO

Por mim tudo bem.

JORGE

Então pronto. Agora somos o Grito Distorcido, de Paulo Afonso para o mundoooooo.

ASTROBALDO

Sim, e a Cida? (fala para a cida) Jorge disse que você é cantora. Você sabe mesmo cantar?

JORGE

Ela canta tão bem quanto você toca guitarra!

SEI NÃO

Vamos deixar de conversa furada. Que tal se agente tirasse um som e ela nos mostrasse o que consegue fazer??

Jorge vai até Cida, estende a mão e ela retribui extendendo a dela. Jorge beija a mão de Cida e a conduz até o centro da sala. No caminho ela passa por Sei Não, estranha a camisa de força e para observando.

SEI NÃO

Comprei em Washington, dizem que todo mundo lá tá usando...

Jorge puxa Cida para afasta-la de Sei Não. Sei Não leva um banco para próximo da parede, mais ou menos centralizado com o vão da sala. O grupo forma uma roda: Sei Não, Jorge, Cida e Astrobaldo, dispostos em sentido horário.

Jorge está com as mãos vazias. Faz de conta que tem um baixo e começa a tocar e cantarolar uma passagem com a boca, como se fosse o som do instrumento.

O grupo todo começa a tocar, mas ninguém tem instrumento. Cida observa Jorge e os outros, depois começa dançar por imitação, compassada e levemente, mas fora do ritmo.

câmera em Jorge

Jorge está simulando tocar baixo, mas não tem instrumento nenhum nas mãos.

câmera gira até Cida

FX: música cantarolada por Jorge

Cida está próxima a um pedestal com microfone, mas não dá atenção ao objeto, é como se ele não existisse. Permanece dançando o tempo todo, sem se preocupar com o ritmo da música.

Câmera gira até Astrobaldo

FX: Música com evidência de guitarra, Crescendo (fade in) na medida em que a câmera sai de Cida para Astrobaldo.

Astrobaldo está segurando uma guitarra e dançando.

Câmera gira até Sei Não

FX: Transição (sincronizada com a câmera) para uma música com predominância de bateria, diferente da anterior.

Sei Não está sentado em uma bateria, tocando.

Câmera gira até Jorge

FX: Transição (sincronizada com a câmera) para uma música com predominância de baixo, diferente da anterior.

Jorge está dançando com um baixo na mão, mas faz apenas coreografias, sem tentar tocar o instrumento.

FX: Mistura de todas as músicas anteriores

A banda está com os intrumentos. Astrobaldo e Sei Não tentam tocar. Cida dança despreocupada, virada para a banda e de costas para o microfone. Jorge faz coreografias malucas com o baixo na mão, mas não tenta toca-lo. Jorge para de dançar repentinamente.

Jorge está com as mãos levantadas, sem nenhum instrumento.

JORGE

Para! Para todo mundo!

FX: pára a música, som ambiente

A banda para de tocar, ninguém tem instrumento algum nas mãos e o pedestal com o microfone também não está lá. Cida para de dançar e fica olhando para Jorge, sem saber o que está acontecendo. Enquanto os rapazes discutem ela se afasta e começa a se entreter com os objetos da sala.

JORGE

Que tal se agente tentasse tocar a mesma música?

SEI NÃO

E que música você quer tocar?

JORGE

Eu sei lá, qualquer uma.

ASTROBALDO

Tem que ver quais músicas a Cida sabe cantar, né.(para Cida) Diz aí, Cida, você tem alguma sugestão?

Cida não presta atenção em Astrobaldo, nem faz questão de participar da conversa.

JORGE

(Interrompendo, para trazer a atenção do grupo para si)

Acho que podia ser aquela música...

SEI NÃO

Qual? aquela?

JORGE

Sim, aquela mesmo.

ASTROBALDO

De que música vocês estão falando?

SEI NÃO

Oxe, aquela, rapaz, você não se lembra?

ASTROBALDO

(Pensativo)

Aquela?? ahhh, aquela, lembrei! Ô Cida, você sabe cantar aquela música?

JORGE

(interrompendo)

Mas é claro que ela sabe! Vamos logo que o tempo está passando.

Jorge se aproxima de Cida e a pega carinhosamente pelo braço.

Jorge conduz Cida até o seu lugar na roda.

Jorge se prepara para tocar, e começa.

O grupo está agora com os instrumentos. Começam a tocar, da mesma forma que da vez anterior.

FX: Trilha sonora da banda

Clique aqui e veja os detalhes do roteiro

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